Há exatos trinta anos, eu caminhava através da porta de
entrada de uma UTI, estranhando como podia um paciente adentrar uma UTI
caminhando com os próprios pés. Tudo que eu sentia era um cansaço que não era
sono, mas literalmente debilidade. A equipe médica mandou que eu me despisse e
me deitasse na cama. Pensei comigo: se me cobrirem com o lençol até a cabeça,
então é porque eu morri e ainda não me dei conta do fato. Menos mal: fui
coberto até a altura do peito e imediatamente aplicaram terminais de
monitoramento cardíaco, o que naquela altura do fato era uma boa notícia: havia
um coração batendo naquele corpo de vinte e dois anos incompletos, deitado
naquela cama.
Há exatos trinta anos eu iniciava, ainda sem saber, uma luta
ferrenha contra um tipo sorrateiro e tremendamente agressivo de câncer no
sistema linfático. Sorrateiro, porque até aquele momento, tudo que eu sentia
era cansaço, já por dois dias, que eu tomei como um início de resfriado, afinal
o tempo andava frio e úmido. O senso comum espera que um paciente de linfoma
apresente gânglios linfáticos aumentados, mas nada disso ocorreu comigo. Só o
cansaço, até então. Agressivo, porque minha medula vinha produzindo milhões de linfócitos
alterados, gigantes, que não reconheciam as outras células do sangue como
amigas. Em suma, meu sangue havia se tornado, silenciosamente, uma massa
avermelhada com lixo de células em suspensão. Era como se eu estivesse me
autodevorando, silenciosa, porém contínua e velozmente. A propósito, tanta
matéria morta em suspensão no meu sangue entupiu a minha válvula mitral e meu
coração não conseguia bombear a quantidade adequada de sangue para o corpo, que
sem a quantidade mínima de oxigênio, não conseguia converter alimento em
energia. Por isso eu cansava tão facilmente.
A partir daquele vinte e um de abril de 1985, o Brasil se
despedia de Tancredo Neves e eu era apresentado àquela que seria a luta pela
minha vida. Foram dois anos e meio de lutas que incluíram cirurgia, quimioterapia,
radioterapia, psicoterapia, fisioterapia e muito amor e dedicação da família,
amigos e equipe médica, liderada pela Dra. Cláudia Bettoni, hoje uma grande
amiga. Graças a essas almas generosas que DEUS Todo Poderoso colocou no meu
caminho, todos os dias eu quebro o meu próprio recorde de sobrevivência.
A Ele, toda a honra, toda a glória e todo poder, ontem, hoje
e sempre.
Nenhum comentário:
Postar um comentário