sábado, 16 de junho de 2007

Auxiliadores Soberbos e Suas Fábricas de Órfãos

"Deus não revogará a sua ira; debaixo dele se encurvam os auxiliadores soberbos. Quanto menos lhe responderia eu, ou escolheria diante dele as minhas palavras! Porque, ainda que eu fosse justo, não lhe responderia; antes ao meu Juiz pediria misericórdia. Ainda que chamasse, e ele me respondesse, nem por isso creria que desse ouvidos à minha voz. Porque me quebranta com uma tempestade, e multiplica as minhas chagas sem causa. Não me permite respirar, antes me farta de amarguras. Quanto às forças, eis que ele é o forte; e, quanto ao juízo, quem me citará com ele? Se eu me justificar, a minha boca me condenará; se for perfeito, então ela me declarará perverso. Se for perfeito, não estimo a minha alma; desprezo a minha vida. A coisa é esta; por isso eu digo que ele consome ao perfeito e ao ímpio." (Jó 9:13-22)

Esta passagem nos mostra um Jó que não consegue entender o porquê de tantos infortúnios se abatendo simultaneamente em sua vida. Logo ele, que se antecipava ao pecado e sacrificava a DEUS por conta das infrações e injúrias que ele e seus familiares porventura tivessem cometido em relação a DEUS? Logo ele, sobre quem o próprio DEUS se referira como reto e justo? Que fizera ele para merecer tamanho sofrimento em sua vida? Jó estava atordoado, assim como qualquer um de nós estaria.

Quando vemos uma pessoa de boa índole sofrer, muitas vezes nos questionamos sobre os objetivos de DEUS para aquela vida. Chegamos mesmo a nos questionar sobre a presença de DEUS na vida daquela pessoa. Pior: chegamos a duvidar da boa índole da pessoa que sofre e até da própria existência de DEUS diante de tanto sofrimento. "Onde está DEUS, que não vê tanto sofrimento?", vários perguntam.

Há um ditado, não sei se americano ou britânico, que diz: "Os bons morrem jovens". No Brasil, nossa índole crítica e ácida verteu esse ditado para uma perspectiva mais negativista, diante da suposta longevidade dos maus sobre os bons: "Vaso ruim não quebra". Pois digo que não só DEUS está justamente vendo todo aquele sofrimento, como também sabe se aquela pessoa tem ou não a capacidade de suportar aquele sofrimento. E aquela pessoa era Jó!

No versículo 13, Jó emite um pensamento que nos leva a uma ponderada e terrível conclusão: "Deus não revogará a sua ira; debaixo dele se encurvam os auxiliadores soberbos". A partir dessa frase construo o meu raciocínio: Quem de nós teria suportado o que Jó suportou, sem antes sucumbir nos primeiros momentos? Sabemos de Jó que era "homem íntegro, reto e temente a Deus e desviava-se do mal", conforme o versículo 1 do primeiro capítulo. E quanto às demais pessoas que vieram após Jó? E quanto a nós, que tantas vezes tropeçamos ao longo da nossa jornada e muitas vezes sequer pedimos perdão a DEUS pelas nossas asneiras? Teríamos a força espiritual necessária para suportar a décima parte do que Jó suportou? Certamente que, por muito menos que a décima parte, muitos já teriam sucumbido e amaldiçoado a DEUS, como a própria esposa de Jó recomendara.

Por isso volto-me aos auxiliadores soberbos do versículo 13 e os contraponho ao exemplo de Jó: Soberba versus humildade. É claro que já sabemos onde esse embate nos levará. Jó desenha o desfecho: tanto o soberbo como o humilde se encurvam diante de DEUS, porém apenas o humilde é exaltado. Certamente que DEUS a seu tempo poderá declarar um "Basta!" para o sofrimento do soberbo e do humilde, porém ao final restarão, não mais um humilde e um soberbo, mas um humilde e um humilhado, que também pode vir a tornar-se um humilde a seu tempo - ou permanecer humilhado eternamente. A escolha é de cada um - mesmo! Se não, vejamos:

1. Auxiliadores soberbos tendem a se achar suficientemente perfeitos.

Sua altivez os leva a se comportarem como verdadeiras torres, virtualmente inexpugnáveis em sua verdade particular, inquestionáveis quanto à sua interpretação de certo e errado e quanto ao seu proceder e o dos outros. Trazem sobre si responsabilidades não requeridas pelos seus líderes e pares. Acabam se sobrecarregando e se esgotando desnecessariamente. Sofrem com a falta de reconhecimento alheio e com os resultados não alcançados pela equipe da qual fazem parte, localizando a culpa em tudo que não lhe diz respeito diretamente. Acabam por se sentirem sabotados pelo mundo que os cerca, pois é como se todos fossem contra ele e seus ideais. Absalão, filho de Davi, preso aos galhos de um carvalho que nenhum esforço fizera para embaraçá-lo (II Samuel 18.9) além de meramente estar ali, é um retrato típico de como um auxiliador soberbo acaba se enredando no seu próprio egoísmo.

2. Auxiliadores soberbos têm muita voz e pouco ouvido.

Ao olharmos o desenho de um relâmpago no céu, vemos que sua trajetória raramente é retilínea, mas distribuída em traços iguais aos de um arbusto seco. Se unirmos a esse raciocínio o fato de que a eletricidade - mesmo a que vem dos céus - percorre sempre o caminho mais fácil, essa visão espalhada de um relâmpago pode soar paradoxal: Por que então o relâmpago não percorre uma única linha reta, de alto a baixo, como um raio laser, em vez de desenhar um tronco espalhado em galhos ao longo de seu percurso? Simples: Porque o caminho mais fácil nem sempre é o caminho mais curto. Da mesma forma, a força da gravidade, combinada ao relevo do solo é que determinam o curso, a direção e a velocidade dos rios. A água sempre seguirá o caminho mais fácil, mesmo que não seja o mais curto.

Mas os planos do auxiliador soberbo são traçados quase sempre em linha reta. Está tudo esquematizado em sua mente e ele se deleita em explaná-los em detalhes, sem espaço para questionamentos. Muito falam, pouco ouvem. Provavelmente já nasceram sabendo tudo que realizarão e certamente o mundo sucumbirá diante de tanta genialidade. Não consideram percalços, reveses ou a experiência de quem já esteve lá e viveu situação semelhante. Nada há que possa ser retocado ou ajustado. Vai dar tudo certo, até o momento em que o imprevisto e o tempo sobrevêm, atirando a trajetória planejada para o acostamento ou precipício mais próximo. Se ao menos tivessem tido tempo para ouvir a recomendação daquele irmãozinho humilde... Adolf Hitler ignorou as lições de história, onde seu ídolo Napoleão Bonaparte fora traído pelo rigorosíssimo inverno russo e retornou, cabisbaixo, derrotado e com severas baixas em seu exército faminto e doente, da mesma forma que duzentos anos antes voltara Napoleão.

3. Auxiliadores soberbos geram poucos herdeiros, mas deixam muitos órfãos.

Chega um dia em que o nosso tempo termina e nossa força declina. Não falo aqui da velhice, mas do esgotamento físico, mental e espiritual que sofrem aqueles que se julgam capazes de carregar o mundo em suas pobres costas. Via de regra, um soberbo gera outros soberbos, que muito provavelmente lutarão entre si pela primazia da liderança - só pode haver um, diria o fantasioso highlander McLeod. Também eles se esgotarão e cansarão ao combaterem entre si. É fato, a herança do soberbo se autodizima e encolhe. Quanto àqueles que eram simplesmente seus seguidores, sem serem no entanto discípulos, estes ficam órfãos e tendem a se espalhar, como ovelhas que não tem pastor, à procura de quem os conduza. Ainda que o objetivo inicial da obra tenha sido nobre, acaba sendo interrompida pelas consequências do caráter soberbo de quem a executa.

4. DEUS acaba envergonhando os auxiliadores soberbos.

Os seguidores de Nimrod uniram esforços para erguer uma torre que alcançasse os altos céus, pois não confiaram na promessa de DEUS sobre não mais exterminar a humanidade através de um dilúvio. DEUS sabia que eles até seriam capazes de levar a cabo aquele intento rebelde. Antes porém que sua obra tomasse corpo, a confusão de línguas imposta por DEUS os espalhou pelo mundo (Gênesis 10:8-10 e 11:6-9) conforme seu mandado anterior.

DEUS é soberano para fazer cumprir a sua vontade. Diante dele o soberbo se humilha e vê que seus planos são palha que o fogo consome e o vento leva. Mas àquele que se submete aos seus desígnios ele concede dupla honra (Isaías 61:6-9). DEUS restituiu duplamente a Jó tudo que o inimigo havia destruído (Jó 42.10). Ele suportou a prova e pode enfim dizer: "Com o ouvir dos meus ouvidos ouvi, mas agora te vêem os meus olhos" (Jó 42.5).

Que possamos todos nós submetermo-nos à vontade de DEUS, para que mesmo diante da vergonha recebamos dupla honra. Amém!

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